Com os pré-candidatos à
Presidência da República lançados quase um ano antes da eleição, deputados e
senadores passaram a antecipar a busca por partidos alinhados às suas posições
eleitorais. O troca-troca partidário teve início ainda em 2021 e nesta quarta-feira,
26, se acentuou com evento que marcou a migração em bloco de integrantes do MBL
– antes espalhados por várias legendas – para o Podemos de Sérgio Moro.
No caso dos deputados
federais, estaduais e distritais, o movimento contraria norma do Tribunal
Superior Eleitoral (TSE), que abre a janela partidária para trocas de siglas só
a partir de 3 de março. Mas a antecipação da pré-campanha ao Planalto, aliada a
acordos entre as agremiações, “liberou” os parlamentares a mudar de casa ou ao
menos anunciar essa intenção antes da hora.
Desde meados do ano passado,
ao menos oito deputados federais já se filiaram a legendas diferentes das que
os elegeram em 2018, segundo levantamento feito pelo Estadão. Somados os que
revelaram essa intenção ou que só assinaram a ficha em atos simbólicos, como
Kim Kataguiri ontem (que trocará o DEM pelo Podemos), a conta vai a 13.
Entre os senadores – que são
“donos” de seus mandatos e, por isso, podem mudar de sigla a qualquer tempo – o
total de trocas efetivadas e anunciadas chega a 14. Segundo o Senado, 12 deles
já avisaram a Casa oficialmente. Nesta lista, está, por exemplo, Fabiano
Contarato (ES), que deixou a Rede para se filiar ao PT.
A antecipação à janela é
atípica, já que o parlamentar pode responder por infidelidade partidária se a
agremiação de origem ou o Ministério Público eleitoral decidir entrar com
representação na Justiça. Para contornar possíveis punições, alguns deputados
recorrem ao TSE para solicitar a mudança fora do período permitido. É possível,
por exemplo, pedir desfiliação por “justa causa” em caso de incorporação, fusão
ou criação de uma sigla, mudança substancial ou desvio reiterado do programa
partidário e, ainda, discriminação pessoal. Caso contrário, pode haver perda do
mandato.
‘Fator Moro’
Realizado ontem, em São Paulo,
o evento simbólico de adesão do MBL ao Podemos contou com o deputado estadual
por São Paulo Arthur do Val (agora ex-Patriota), que pretende se lançar ao
governo do Estado. Ele afirmou que o “fator Moro” foi decisivo para o ingresso
antecipado na legenda. “Temos apoio recíproco das respectivas pré-candidaturas.
É natural que estejamos no mesmo partido”, disse. “Essa união não é entre
partidos políticos, é entre movimentos, partidos e pessoas. Setor privado e
sociedade civil. O PT está ameaçando voltar para São Paulo. Precisa colocar
aqui no Estado de São Paulo uma posição firme e forte contra esse tipo de
proposta”, afirmou Moro.
Expulso do DEM em 2019, Do Val
obteve autorização para migrar para o Patriota e, agora, trocar de agremiação
de novo. Kataguiri tentará contornar a janela partidária solicitando acordo ou
saída da atual sigla por justa causa, o que poderá ocorrer se a fusão do DEM
com o PSL para a formação do União Brasil for homologada antes da janela
partidária.
Outros quatro parlamentares
usam estratégia parecida na tentativa de evitar a perda do mandato, anunciando
a saída sem, de fato, deixar a legenda. É o que aconteceu, por exemplo, com o
deputado federal Tulio Gadelha (PDT-PE). Apesar de afirmar publicamente que migraria
para a Rede, Gadelha segue no PDT e participou da convenção nacional do
partido, data em que o nome de Ciro Gomes foi anunciado como pré-candidato ao
Planalto. Em nota, o PDT afirmou que não pretende solicitar punição ao
parlamentar.
Reforços
Outros presidenciáveis também
têm atraído quadros para os seus respectivos partidos ou siglas aliadas. No
caso do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, não apenas o PT tem ganhado
quadros novos, mas também o PSB – ambos ensaiam a oficialização de uma federação
que incluiria ainda o PSOL e o PCdoB.
Marcelo Freixo (RJ) é exemplo
desse movimento. Pré-candidato ao governo do Rio, ele saiu do PSOL após acordo
e migrou para o PSB no ano passado, com o apoio de Lula. Atual governador do
Maranhão e pré-candidato ao Senado, Flávio Dino deixou o PCdoB para seguir o
mesmo caminho.
O PSB atrai nomes até do
Centrão que não apoiam a reeleição do presidente Jair Bolsonaro, como Jorge
Boeira (RS), que saiu do PP, e o vice-presidente da Câmara, Marcelo Ramos (AM),
que, autorizado pela Justiça Eleitoral, já anunciou sua desfiliação do PL, nova
sigla do presidente.
Ramos está em tratativas com o
PSB e disse não ter restrições quanto a subir no palanque de Lula no Amazonas.
Sua única certeza, segundo ele, é não apoiar Bolsonaro. “Não posso permanecer
em um partido que tem um presidente da República que considero não ser bom para
o País, que, graças a ele, entrou em situação sanitária grave e uma crise
econômica desesperadora. Não dá para ajudar um projeto que criou essas condições.”
O deputado também mantém diálogo com Solidariedade, Republicanos, União Brasil
e PSD.
Também crítico ao governo
federal, o ex-ministro e ex-deputado federal Maurício Quintella (AL) anunciou
sua saída da sigla um dia após a chegada de Bolsonaro, deixando a presidência
do diretório alagoano para o deputado Sérgio Toledo (AL). “Todos nós, do diretório,
apoiamos a entrada do presidente; quem não apoiou, se desfiliou, como o
Quintella”, declarou Toledo.
‘Efeito Bolsonaro’
No sentido contrário, o
“efeito Bolsonaro” também foi responsável por atrair nomes para o PL. As
deputadas Bia Kicis (DF) e Carla Zambelli (SP) acenam ao partido, assim como os
ministros Onyx Lorenzoni (Trabalho e Previdência) e Tarcísio de Freitas
(Infraestrutura).
O governador João Doria (PSDB)
e o ex-ministro Ciro Gomes (PDT) também têm buscado novos quadros (não apenas
deputados e senadores) para fortalecer suas campanhas e facilitar alianças
regionais. O tucano conseguiu neste ano “tirar” o presidente estadual do
Podemos do Paraná da aliança com Moro e filiá-lo ao PSDB para disputar o
governo do Estado. Ano passado, já tinha assinado a ficha de Joice Hasselmann
(SP).
Ciro atraiu o deputado federal
David Miranda (RJ), que deixará o PSOL por causa do provável apoio do partido a
Lula. A perspectiva é que mais trocas ocorram a partir de março. Doria, Ciro e
Moro disputam entre si protagonismo na chamada terceira via.
Pressa
O cientista político Rodrigo
Prando, da Universidade Presbiteriana Mackenzie, avaliou que o retorno de Lula
ao tabuleiro eleitoral acelerou as mudanças partidárias. “As pessoas se
apressam para se mostrar ou distantes do projeto político de Lula ou próximas
de seus valores e ideologias”, disse. Prando acrescentou que a antecipação é
esperada em uma sociedade hiperconectada e pautada pelo imediatismo. Segundo
ele, há uma necessidade constante de se manifestar o quanto antes sobre os
acontecimentos da arena política, fornecendo respostas rápidas aos eleitores.
“O tempo da política
institucional, com toda a burocracia legislativa, remonta a séculos passados.
Hoje, esperam-se respostas imediatas dos parlamentares”, afirmou.
As informações são do jornal O
Estado de S. Paulo.
Quinta-feira, 27 de janeiro
2022 às 9:28