Relatório produzido a pedido da CPMI das
Fake News identificou 2,065 milhões de anúncios pagos com verba da Secretaria
de Comunicação Social da Presidência da República (Secom) em sites, aplicativos
de telefone celular e canais de Youtubers que veiculam conteúdo considerado
inadequado. Entre eles estão sites que divulgam notícias falsas, oferecem
investimentos ilegais e até aplicativos com conteúdo pornográfico.
O
relatório, elaborado por consultores legislativos, foi divulgado nesta
terça-feira pela CPMI. Seus dados foram obtidos por meio da Lei de Acesso a
Informação (LAI).
O
relatório diz que, apesar de ter solicitado informações do período entre
janeiro e novembro de 2019, a Secom só forneceu dados referentes a 38 dias,
entre 6 de junho e 13 de julho do ano passado.
Mesmo
assim, segundo o relatório, foi possível identificar que parte dos anúncios
pagos pela Secom foi parar em canais com conteúdo inadequado.
A
verba utilizada neste período era para a campanha sobre a Reforma da
Previdência e se refere a recursos distribuídos na internet por meio da
plataforma Adwords e Adsense do Google. Essa publicidade é direcionada de forma
automática aos sites pelas plataformas, mas é possível ao anunciante bloquear
tanto sites específicos quanto categorias de assuntos.
No
total, os consultores da CPMI idenficaram 843 canais considerados inadequados
que veicularam um total de 2.065.479 anúncios. Entre esses canais estão 47
sites que divulgam notícias falsas, 741 canais do Youtube que foram removidos
pela plataforma por descumprimento de regras, 12 sites com notícias sobre jogos
de azar, sete que fazem ofertas de investimentos ilegais e quatro com conteúdo
pornográfico.
A
classificação do que é um site que divulga notícias falsas foi feita pela
própria equipe que elaborou o relatório. Entre os sites colocados nesta
categoria estão o “Jornal da Cidade Online”, “Jornal 21 Brasil”, “Terça Livre”,
“Folha do Brasil”, “Diário do Centro do Mundo” e “Revista Fórum”. O “Jornal da
Cidade Online” é o mesmo que, segundo o perfil Sleeping Giants Brasil, recebeu
verba publicitária do Banco do Brasil.
Ao
todo, os 47 sites que divulgam notícias falsas identificados pelo relatório
receberam 653.378 anúncios. Os sites com conteúdo pornográfico receberam 27
anúncios.
O
documento aponta ainda a necessidade de questionar a Secom sobre o total de
anúncios veiculados ao longo de todo o ano de 2019 em relação ao site Terça
Livre, do blogueiro Allan dos Santos. O relatório afirma que, durante oitiva na
CPMI, o blogueiro afirmou que não recebia dinheiro público, mas os dados da
Secom mostraram que seu canal no YouTube recebeu 1.447 anúncios.
“Necessário,
portanto, formular questionamento àquela secretaria para quantificar exatamente
o montante pago ao canal em todo o período de vigência do contrato com o Google
Adsense, tendo em vista que tivemos acesso apenas aos dados parciais”, diz um
trecho do relatório.
Allan
dos Santos é um dos investigados no inquérito que tramita no Supremo Tribunal
Federal (STF) e que investiga uma suposta rede de divulgação de notícias falsas
e ataques contra ministros da Corte. No domingo, reportagem do GLOBO revelou
que, além de receber por anúncios pagos pela Secom, o blogueiro recebeu por
anúncios pago pela Petrobras e Eletrobras.
Foram
identificados ainda cinco canais que fazem promoção pessoal de autoridades como
o presidente Jair Bolsonaro e que receberam anúncios pagos pela Secom. Entre os
canais identificados pelo documento estão canais no YouTube como o “Bolsonaro
TV” e o canal pessoal do senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), além do site do
senador.
O
relatório aponta que a destinação de verba pública para a promoção pessoal de
autoridades pode ser interpretada como violação à Constituição Federal.
“A
veiculação de anúncios, pela Secom, em canais desse tipo pode gerar
questionamento com base no § 1º do art. 37 da Constituição, pois abre a
possibilidade de se interpretar tal fato como utilização da publicidade oficial
para promoção pessoal, conduta vedada pela Carta Magna”, diz um trecho do
documento.
O
documento critica a forma como a Secom utilizou suas verbas e aponta para o
potencial prejuízo à imagem do governo.
“Além
disso, fica claro que a utilização do programa Google Adsense pela Secretaria
Especial de Comunicação Social da Presidência da República gerou várias
incorreções na condução da política de publicidade oficial da Presidência da
República”, diz um trecho.
“Como
pudemos observar, houve descontrole do target (alvo) das ações publicitárias, o
que redundou em desperdício de recursos públicos. Adicionalmente, o dinheiro da
publicidade oficial terminou por ser empregado em diversos canais com conteúdo
inadequado, fazendo com que a imagem do Governo Federal fosse veiculada em
canais de baixa qualidade e associada a conteúdos falsos, criminosos, de cunho
sexual ou referentes a promoção pessoal do Presidente da República”, diz outro
trecho do relatório.
*O
Globo
Quarta-feira,
03 de junho, 2020 ás 10:00