A 11 meses do pleito, os
lances deste novembro farão história na disputa presidencial de 2022. E não
apenas pelo início da pré-campanha de Sérgio Moro. A filiação do ex-juiz ao
Podemos não é uma surpresa, mas provoca um rearranjo que aprofunda a
fragmentação da terceira via, o caminho do meio entre o esfaqueado e o ex-presidiario.
Nos dias 21 e 22, os tucanos
vão às prévias para escolher seu representante, enquanto o presidente Jair
Bolsonaro decide se entra ou não no PL. Estes e outros fatos marcam uma
“novembrada”, diz o sociólogo e cientista político Antônio Lavareda. Nesta
entrevista, ele avalia os próximos passos da corrida eleitoral:
Como a chegada de Moro impacta
o tabuleiro das eleições?
Ela deu impulso a uma
“novembrada” que terá destaque na história do pleito de 2022. Temos o ex-juiz
no Podemos, prévias no PSDB e Bolsonaro migrando para o PL. Vale citar o
nascimento do União Brasil, na fusão DEM e PSL, que passa a ser a maior legenda
do País uma vez registrada no Tribunal Superior Eleitoral. Ciro Gomes inaugurou
a movimentação, retomando as rédeas do PDT na votação da PEC dos precatórios.
Desses fatos, cuja importância agita o noticiário e dá visibilidade aos
pré-candidatos, não se deve aguardar grandes alterações nas pesquisas. De Moro
a Lula, nenhum desses nomes saiu das listas testadas mês a mês pelos
institutos. Lula, seguido por Bolsonaro, deve se manter na liderança, com a
terceira colocação disputada por Ciro e Moro. Além do presidente, os demais
candidatos prefeririam que o ex-juiz ficasse fora da disputa; ele amplia a
fragmentação e dificulta a decolagem de um nome da terceira via.
O que o discurso de Moro
mostra de projeto de País?
Ele fez uma “panorâmica” dos
principais problemas, enfatizando a gravidade da crise social e econômica,
procurando deixar a imagem de alguém monotemático. Como a última pesquisa
Ipespe mostrou, 44% dos brasileiros querem que o próximo presidente se dedique
aos temas econômicos na largada do mandato, ao passo que apenas 6% querem vê-lo
priorizar o combate à corrupção. O esforço inicial, correto, de Moro, não será
uma tarefa fácil, pois ele chega impregnado pela longa exposição na mídia como
juiz e, depois, como ministro de Bolsonaro. Segundo a Bíblia – por acaso no
Livro dos Juízes – Deus dá até duas oportunidades aos escolhidos. Moro seria
imbatível em 2018, no apogeu da Lava Jato. Não foi candidato. E teve uma
segunda chance após sair do ministério. Em abril de 2020, com 18%, estava dois
pontos atrás de Bolsonaro. Mas saiu do País e tenta hoje uma terceira
oportunidade de protagonizar. Inicia agora bem abaixo (8%). É mais forte entre
os eleitores mais velhos, de maior escolaridade, no Sul e Sudeste. Ainda
distante de Bolsonaro mesmo nesses segmentos. Terá de disputar os 55% que
elegeram o presidente.
Ciro fez uma aposta de risco
ao trucar a bancada do PDT ou foi jogo de cena?
“Ciro sendo Ciro.” Impetuoso,
movido por convicções. Foi essa a mensagem que desejou passar. Risco calculado.
Ele conhece seus correligionários, e estes sabem que o PDT não poderia
prescindir da candidatura. Tem buscado atualizar sua imagem. A confirmação de
Moro lhe traz dificuldades. Com Lula tomando a maior fatia do voto à esquerda,
restou-lhe buscar uma fatia da centro-direita. Esse espaço, já povoado por
muitas candidaturas, fica ainda mais saturado.
O PSDB sairá das prévias como?
Elas foram uma saída
inteligente dos tucanos para escapar à irrelevância. Ocuparam espaço na mídia,
geraram expectativa e mexeram nos brios do partido afetado pela letargia após a
derrota de 2018. E apontam para a necessidade de o Brasil adotar
obrigatoriamente esse caminho de escolha transparente democrática vigente em
outros países.
E o que vem por aí?
Depois da “novembrada”, as
atenções estarão voltadas para as composições finais, coligações e acerto dos
vices. Isso de dezembro até meados do primeiro semestre de 2022. Vale um olhar
especial sobre o saldo contábil das migrações na janela partidária de março.
Afora um eventual resultado positivo do esforço de coordenação de uma
candidatura competitiva mais à centro-direita, enxugando a lista de candidatos
não deve haver novidades: 2022 será uma eleição “normal”, sem espaço para
outsiders.
* Estadão
Quarta-feira, 17 de novembro
2021 às 12:09