Já
falamos muito aqui na Tribuna da Internet sobre a reunião ministerial do dia 22
de abril, mas o tema é inesgotável. Além daquela impressionante apresentação do
presidente Jair Bolsonaro, que mais parecia à beira de um ataque de nervos,
como se fosse personagem do genial cineasta Pedro Almodóvar, é preciso notar
também as participações especiais de três outros grandes membros do elenco – o
chefe da Casa Civil, Braga Netto, o vice-presidente Hamilton Mourão e o então
ministro da Justiça, Sérgio Moro.
O
general Braga Netto ainda teve algumas falas, tentava organizar a bagunça,
funcionava como uma espécie de primeiro-ministro, digamos assim, mas o ex-juiz
Moro e o vice Mourão entraram mudos e saíram calados, embora suas posturas
sempre fossem muito significativas. Afinal, como o mestre chinês Confúcio dizia
em relação à imagem, também um olhar pode ser mais expressivo do que mil
palavras.
Mourão
e Braga tinham comportamento semelhante quando Bolsonaro viajava naquelas
frases agressivas, ameaçadoras e desconexas – os dois faziam olhar de paisagem,
era como se não estivessem ali.
Só
de vez em quando é que fitavam o delirante presidente. A diferença é que Braga
demonstrava impaciência, enquanto Mourão exibia um discreto sorriso irônico. É
claro que o vice-presidente está assistindo à derrocada de seu ex-amigo
Bolsonaro com indisfarçável satisfação, um sentimento natural para quem foi tão
humilhado como ele, a ponto de ser impedido de ocupar a Presidência durante a
longa recuperação de Bolsonaro na terceira cirurgia.
Na
reunião, Mourão tinha um caderninho que o livrava de ficar olhando para
Bolsonaro. Entre um faniquito e outro, Mourão fingia fazer alguma anotação e
conseguia se abstrair. Mas o ministro Braga Netto, que ainda não usa o
caderninho salvador, tinha de se socorrer mexendo no celular, e seu
constrangimento na reunião era indisfarçável.
Entre
os principais personagens, detectava-se um clima de cinismo e hipocrisia, dois
sentimentos que parecem caracterizar esse governo. O ex-juiz Moro destoava dos
demais. Ficou praticamente o tempo todo na mesma posição, com o semblante
fechado, os braços cruzados e sem jamais olhar para Bolsonaro, nem mesmo nos
momentos de maior agressividade do presidente. Moro comportou-se com a
dignidade de sempre, era um personagem à parte naquele palco iluminado e sem
estrelas.
Em
suma, é preciso dizer que o ministro Celso de Mello prestou um inestimável
serviço público.ao permitir a divulgação da quase totalidade da reunião
ministerial do dia 22 de abril, quem assistiu ao vídeo ficou conhecendo
Bolsonaro melhor e passou a ter certeza de que ele não tem o menor equilíbrio
para presidir esse país.
Aliás,
tinha tudo para dar certo. Sua ascensão ao poder foi cercada por um fortíssimo
clima de esperança que ele não soube cultivar ou manter. Agora, desde o início
deste ano ele se arrasta pateticamente no Planalto, como um zumbi político
caminhando contra o vento, sem lenço e sem documento, como dizia Caetano
Veloso.
*Tribuna
da internet
Quinta-feira,
28 de maio, 2020 ás 11:00
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