A
procuradora-geral da República, Raquel Dodge, “segurou” casos da Lava Jato por
um ano ou até mais. A desaceleração nos ritmos de trabalho da investigação
levou o ministro Edson Fachin, relator da operação no Supremo Tribunal Federal,
a questionar, no mês passado, a chefe do Ministério Público Federal sobre o
andamento das apurações, conforme documento obtido pelo jornal O Estado de S.
Paulo. Raquel deixa nesta terça-feira, 17, o cargo e apresentará uma prestação
de contas sobre os dois anos de sua conturbada gestão.
Fachin
listou 14 casos que estavam, na época, aguardando um posicionamento da
Procuradoria, de dezembro de 2017 até hoje – uma soma que chega a 21 meses. Um
dos mais emblemáticos é um inquérito que investiga o ex-presidente do Senado
Eunício Oliveira (MDB-CE). A apuração foi aberta a partir do acordo de
colaboração premiada celebrado pelo Ministério Público com Nelson José de
Mello, ex-diretor institucional do grupo empresarial Hypermarcas, que relatou
valores repassados ao emedebista. Encaminhado à Procuradoria em março de 2018,
o inquérito até hoje não retornou ao Supremo para ser analisado por Fachin.
Em
dezembro do ano passado, os advogados Aristides Junqueira e Luciana Moura,
defensores de Eunício, reclamaram do ritmo das investigações e pediram o
arquivamento do processo. “A última vez que o inquérito esteve nesse Supremo
Tribunal Federal foi no início de março de 2018. A partir dessa data, os autos
não mais saíram da PGR, eis que este procedimento, desde o início, tem sido
conduzido pelo Ministério Público Federal. A insistência em prolongar as
investigações viola as regras de duração razoável do processo com exposição e
desgaste indevidos do requerente (Eunício)”, criticou a defesa do ex-senador.
Outro
caso mencionado pelo relator da Lava Jato é uma apuração preliminar sobre o
repasse de valores pela JBS a parlamentares em troca de apoio político à
eleição do deputado cassado Eduardo Cunha (MDB-RJ) à presidência da Câmara, em
2014. O caso está parado na Procuradoria há quase um ano.
Um
inquérito que investigava o senador Renan Calheiros (MDB-AL) também ficou quase
um ano parado na Procuradoria até retornar, no início deste mês, ao STF –
depois, portanto, que Fachin enviou o ofício a Raquel. O caso acabou arquivado
pelo relator da Lava Jato.
Em
março, o magistrado enviou à Procuradoria um inquérito que apura se o
ex-senador Edison Lobão (MDB-MA) recebeu vantagem indevida entre 2011 e 2013 –
quando ocupava o cargo de ministro de Minas e Energia no governo de Dilma
Rousseff (PT) -, em virtude de contratos celebrados para a construção da usina
de Belo Monte.
Na
época, Fachin fixou um prazo de cinco dias para que a Procuradoria se
manifestasse se seria o caso de apresentar denúncia, arquivá-lo ou de
prosseguir com as apurações. Até hoje não recebeu resposta.
No
despacho obtido pela reportagem, Fachin cumprimentou Raquel pelo “brioso”
trabalho, mas observou que “se encontram na PGR inquéritos, bem como ações
cautelares e petições (…) no aguardo de diligências e respectivos trabalhos, em
lapso superior ao prazo”.
Raquel
disse que a maior parte das peças (manifestações) ajuizadas no STF está sob
segredo de Justiça. “No tempo próprio elas expressarão o empenho com que eu
trabalhei no enfrentamento da corrupção, naquilo que me cabe de atuação”, afirmou
ela, na semana passada.
Debandada
A
crise na Procuradoria levou, recentemente, um grupo de trabalho da Lava Jato a
abandonar os postos, em sinal de desaprovação à conduta de Raquel na delação da
OAS.
A
procuradora se colocou à disposição do presidente Jair Bolsonaro para ser
reconduzida ao cargo por mais dois anos, mas acabou preterida pelo
subprocurador Augusto Aras, que lançou candidatura avulsa, sem disputar uma
vaga na lista tríplice da categoria. Aras já defendeu uma “disruptura” no
Ministério Público, fez críticas a métodos de investigação “personalistas” da
Lava Jato e prometeu atuar para destravar a economia. A indicação ainda precisa
ser aprovada pelo Senado.
Raquel
enfrentou resistência no Planalto por ter denunciado, no ano passado, Bolsonaro
por racismo e o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), filho do presidente, por
ameaçar uma jornalista. O entorno do presidente também critica a atuação de
Raquel na Lava Jato sob o argumento de que ela não deu prioridade ao combate à
corrupção.
Apurações
Eunício
Oliveira (MDB-CE): O inquérito que investiga se o ex-senador foi beneficiado
com valores repassados pelo grupo Hypermarcas foi enviado à Procuradoria em 2
de março de 2018.
Edison
Lobão (MDB-MA): Lobão é investigado por corrupção e lavagem envolvendo
contratos de Belo Monte. Em março, Fachin enviou o inquérito à PGR para que, em
5 dias, se manifestasse, mas não houve resposta.
Eduardo
Cunha (MDB-RJ): Apuração envolve repasse de valores pela JBS a parlamentares em
troca de apoio à eleição de Cunha à presidência da Câmara, em 2014. O caso está
na PGR desde 21 de setembro de 2018.
Renan
Calheiros (MDB-AL): Caso investigava pagamento de propina por meio de dinheiro
desviado de contrato para a construção de navios-sonda. O caso ficou quase um
ano na Procuradoria. Depois, foi arquivado.
(As
informações são do jornal O Estado de S. Paulo.)
Terça-feira,
17 de setembro ás 12:19
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