O
primeiro ano do governo do presidente Jair Bolsonaro chega ao fim sem que as
principais promessas para o combate à criminalidade tenham entrado efetivamente
em vigor. A proposta de ampliação do acesso às armas de fogo aos cidadãos
comuns e o pacote antricrime do ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio
Moro, por exemplo, enfrentaram forte rejeição no Congresso e foram esvaziadas.
A
redução de vários índices de criminalidade em 2019 segue a tendência dos
últimos anos e se deve, em grande parte, à atuação dos governos estaduais e
municipais. Bolsonaro, quando candidato,
conferiu a mais alta prioridade à bandeira da segurança pública, com um
discurso que foi decisivo para a vitória eleitoral.
Mesmo
com a queda na ocorrência de diversos tipos criminais, sobretudo o homicídio, a
situação da violência no Brasil, da mesma forma que na campanha eleitoral,
ainda apavora os cidadãos.
O
fato de Bolsonaro ter trazido a responsabilidade pelo combate à violência para
dentro do Palácio do Planalto, diferentemente de administrações anteriores,
levou grande parte da opinião pública a atribuir ao governo federal os louros
pela redução dos índices de criminalidade. A participação do ex-juiz Sergio
Moro no governo, no contexto do grande apoio popular à Operação Lava-Jato em
Curitiba, reforçou ainda mais essa percepção na sociedade.
Desde
o início do ano, Moro tem ocupado as redes sociais e o noticiário com um
discurso que busca vincular ao governo os bons resultados nos índices de
criminalidade. E o ministério que comanda adota uma estratégia de comunicação
com o mesmo objetivo.
Segundo
balanço divulgado pelo Ministério da Justiça em 12 de dezembro, a atuação do
Executivo foi decisiva para a redução da ocorrência de nove tipos de crimes no
país. “Estratégia, inteligência, integração e políticas públicas eficazes
permitiram a redução significativa da criminalidade em todo o país”, diz o
ministério.
A
pasta, informa, por exemplo, redução de 22% nos casos de homicídio entre janeiro
e agosto de 2019, em comparação ao mesmo período de 2018. “Foram mais de 6.900
vidas preservadas”, informa.
Houve
queda também, segundo o órgão, nas ocorrências de estupro (-10,5%), tentativa
de homicídio (-6,6%), entre outros. Quanto aos homicídios, a curva decrescente
das ocorrências já vinha sendo registrada nos últimos anos. Segundo o Fórum
Brasileiro de Segurança Pública, a redução dos casos desse tipo de crime em
2018 foi de 10,4% na comparação com 2017.
Em
4 de fevereiro deste ano, Moro apresentou o seu pacote anticrime a governadores
e secretários estaduais de Segurança de todo o país. Com o endurecimento de
leis e dos códigos Penal e de Processo Penal, a iniciativa foi anunciada como
uma política para fortalecer o combate à corrupção, aos delitos violentos e ao
crime organizado.
Logo
na sequência, o primeiro obstáculo para o avanço do pacote anticrime foi colocado pelo presidente da Câmara,
Rodrigo Maia (DEM), que demonstrou irritação ante a pressão do ex-juiz a
Lava-Jato pela aprovação da matéria. O deputado chegou a acusar Moro de ter
feito um “copia e cola”, insinuando que ele havia plagiado propostas elaboradas
pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF).
Com
o apoio até do presidente Bolsonaro, Maia também argumentou que a prioridade,
naquela ocasião, não era o pacote, mas a tramitação da reforma da Previdência.
Além disso, o presidente da Câmara criou uma comissão de parlamentares para
analisar as propostas de Moro, juntamente com as do ministro do Supremo.
Esse
grupo decidiu excluir partes importantes do pacote anticrime, como a
possibilidade de prisão após condenação em segunda instância, e o chamado
excludente de ilicitude, uma mudança legislativa que isentaria de punição
cidadãos comuns e policiais que cometessem excesso em legítima defesa.
E
foi com um formato desidratado que o projeto do ministro foi aprovado no Senado
no início de dezembro, após ter recebido o aval dos deputados. O próximo passo
será a sanção do presidente Jair Bolsonaro, possivelmente com alguns vetos a
dispositivos da matéria.
O
governo também não conseguiu emplacar, como queria, a proposta de flexibilizar
o Estatuto do Desarmamento para que todos os “cidadãos de bem” pudessem ter uma
arma de fogo. No total, foram oito decretos sobre o assunto, e todos
enfrentaram resistência.
O
Ministério Público Federal, por exemplo, pediu a suspensão do Decreto nº 9.785,
que facilitava o porte de armas para algumas categorias profissionais, como
advogados, caminhoneiros e políticos. As reedições, pelo Executivo, dos
primeiros decretos também foram um reflexo do desgaste do tema.
Por
fim, a flexibilização do Estatuto do Desarmamento foi bem menor do que o
prometido durante a campanha presidencial, favorecendo um segmento restrito de
caçadores, atiradores e colecionadores.
Apesar
de não ter cumprindo toda a agenda prometida pelo presidente Jair Bolsonaro
durante a campanha, o ministro da Justiça, Sergio Moro, é o integrante do
primeiro escalão do governo mais bem-avaliado pela população, mais do que o
chefe. Moro, inclusive, é cotado para ser vice na chapa de Bolsonaro à
reeleição.
Um
dos principais apoiadores das propostas do governo na área da segurança
pública, o senador Major Olímpio (PSL) reconhece que a melhoria nos índices de
criminalidade no país deve ser atribuído, principalmente, a estados e
municípios. Segundo ele, os efeitos das políticas federais para o setor, como o
pacote anticrime, só deverão ser sentidos a longo prazo.
“Não
se pode atribuir ao governo federal a responsabilidade pelos resultados positivos
nessa área, até porque essa melhoria é uma tendência que tem sido verificada
nos últimos anos em todo o país. Além disso, o governo federal, ao contrário do
que se esperava, não reforçou os investimentos em segurança, ou seja, não teve
uma responsabilidade direta nessas melhorias”, disse.
“As
perspectivas para 2020 são ainda piores”, acrescentou Major Olímpio, ao falar
sobre a rigorosa política fiscal do governo, que, na sua opinião, deve
continuar a pressionar o orçamento do setor. Segundo ele, não será possível,
por exemplo, ampliar o efetivo da Força Nacional de Segurança, hoje de 800
agentes.
Major
Olímpio também questionou a postura do Ministério da Justiça de atribuir ao
governo a decisão de isolar lideranças de facções criminosas em presídios federais.
“As transferências dessas lideranças foram pedidas pelo Ministério Público e
determinadas pelo juiz corregedor Paulo Sorci”, destacou.
O
parlamentar, porém, considera importante o fato de o presidente Jair Bolsonaro
ter empunhado a bandeira da segurança desde a campanha eleitoral. Ele disse
que, embora o pacote antricrime tenha sofrido alterações no Congresso, o
conjunto de propostas é suficiente para garantir mais segurança à população.
Ele
destacou, por exemplo, o dispositivo que prevê a prisão imediata de condenados
por homicídio, desde que a pena seja superior a 15 anos. Também elogiou o fim
das saídas temporárias de condenados por crimes hediondos.
Já
Arthur Trindade, professor do Departamento de Sociologia da Universidade de
Brasília (UnB) e consultor do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, disse que,
a despeito das condições favoráveis, foram poucas as políticas públicas
efetivamente implantadas pelo governo nessa área.
“Mesmo
assim, Bolsonaro conseguiu administrar as expectativas da população com relação
à insegurança. Ele soube gerir o medo e chamou para si a responsabilidade sobre
a segurança, coisa que os especialistas recomendavam que fosse feito pelos
presidentes ao longo dos últimos 20 anos”, frisou.
Trindade
considera que, entre os resultados positivos da política federal para o setor
está a consolidação do Sistema Nacional de Informações de Segurança Pública,
Prisionais, de Rastreabilidade de Armas e Munições, de Material Genético, de
Digitais e de Drogas (Sinesp).
Correio Braziliense
Domingo,
29 de Dezembro, 2019 ás 11:00
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